*Dom Gílson Andrade
As tradições das celebrações natalinas alcançam o ser humano de modo singular. Ao longo dos séculos a festa de Natal traduziu a verdade da chegada do Filho de Deus, o Menino Jesus, de forma próxima ao concreto da vida, na festa. Afinal, Deus ao se tornar um de nós, assim o faz para que nós alcancemos a plenitude dos seus dons divinos e da felicidade que Ele nos preparou. O Papa Francisco insistentemente gosta de dizer que o estilo de Deus é o da proximidade.
Nos festejos natalinos, esta realidade penetra no coração humano até mesmo pelos sentidos externos e internos. Como a encarnação do Verbo é o meio de salvação do ser humano inteiro, celebrar o Natal de forma até mesmo “sensorial” facilita compreender que na vinda do Filho de Deus está a realização de todos os desejos do coração humano.
A vista, o tato, o olfato, o ouvido, o paladar, os afetos, a imaginação ajudam a aproximar o mistério do Deus escondido no meio das palhas da manjedoura. As luzes das Igrejas, das casas e das cidades já despertam a vista para algo novo que está acontecendo. Jesus traz luz para a nossa capacidade de ver. Assim, somos capazes de ver o mundo com os olhos de Deus, purificando nossa maneira tantas vezes egoísta de enxergar as coisas.
Aproximar-nos da manjedoura sugere pegar o Menino, levá-lo ao colo, como Maria, cantar-lhe uma cantiga de ninar e sentir o calor da presença de Deus humanado. Em meio aos corações insensíveis e frios, tocar o calor do coração do Menino aquece o nosso e nos impulsiona a sair ao encontro dos corações que precisam ser restaurados.
Os anjos cantam, os pastores anunciam o nascimento. Nossos ouvidos, tão acostumados ao cotidiano de notícias preocupantes e duras, acabam por despertar a nossa mente para uma novidade de paz possível. Com o seu nascimento nova esperança acaba de chegar. A partir daqui é possível reconstruir a história e o ser humano por inteiro. Ninguém mais tem razão de se perder na sua desesperança. Por isso, no final Ele dirá: “Ide e anunciai a todos os povos!”
A lembrança do Natal é cheia de delícias e aromas servidos em mesas de famílias reunidas para celebrar. Até aí chegou também a tradição natalina. As tantas delícias servidas no Natal nos fazem recordar que sobre a manjedoura está recostado o Pão da vida, alimento para este mundo e para a eternidade. Sua vida é dada em banquete que sacia os pobres e faz renascer a vida e assim, aprendemos com Ele a partilha não apenas do que temos, mas até mesmo da própria vida.
No meio desses sentidos visitados pela notícia do Natal de Jesus em Belém, desperta o sentido da vida. A trajetória desse Menino é semelhante à dos seres humanos que enfrentam alegrias e tristezas, conquistas e fracassos, sonhos e medos, mas que só na doação de si mesmos encontram o sentido para viver, sofrer e morrer. Em um tempo em que os sentidos estão desgastados porque demasiados explorados, celebrar o Natal, a festa dos sentidos, é oportunidade de um reencontrar-se consigo mesmo, no encontro com Deus próximo e reencontrar a paz que nos faz promotores de paz, a partir dos corações. Deixemos neste Natal que o Menino Deus, em companhia de sua Mãe e de São José, nos visite por inteiro, com tudo o que nos torna presentes neste mundo. Feliz Natal.
*Dom Gilson é carioca, nascido no Méier e criado em Mendes no sul fluminense. Fez parte do clero de Petrópolis, estudou em Roma e foi bispo auxiliar de Salvador (BA). Nomeado pelo Papa Francisco em 27 de junho de 2018, tornou-se o 6º bispo da Diocese de Nova Iguaçu. Em 2018, durante a 57ª Assembleia Geral da CNBB, foi eleito pelos bispos do Rio de Janeiro como Vice-presidente do Regional Leste 1 – CNBB.