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Historiador analisa trajetória dos partidos em 40 anos de democracia

*Luiz Carlos Azedo

Os partidos políticos, organismos centrais da vida democrática, são incapazes de se abrirem para a dinâmica de transformações que ocorrem na vida social e econômica

O livro A Construção da Democracia no Brasil, 1985-2025: mudanças, metamorfoses, transformismos (Annablume/Fundação Astrojildo Pereira), do historiador Alberto Aggio, será lançado hoje, às 19h, na Osteria Vicenza, no Complexo Brasil XXI, em Brasília. Trata-se de uma síntese sobre o processo político brasileiro, que busca uma explicação para o atual momento em que estamos vivendo, no qual o autor registra uma situação de mal-estar e desorientação da sociedade em relação à política, no contexto de grandes mudanças globais.

Aggio é doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP), livre-docente e titular pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Também tem pós-doutorado pela Universidade de Valencia, na Espanha, e pela Universidade Roma Tre, na Itália. “É reconhecível, quase que consensualmente, que há uma crise de legitimação democrática, que se vem impondo às democracias”, constata. O historiador analisa a trajetória dos principais partidos, entre os quais o PSDB e o PT, ao longo desses 40 anos.

Nesse período, houve um gradativo e persistente arrefecimento da formulação programática dos partidos políticos, o enfraquecimento das estruturas de representação e a falta de consenso democrático, que se refletem hoje na ausência de um projeto de nação. O autor adota uma perspectiva muito crítica em relação ao transformismo dos partidos políticos, sem cair na negação de que houve um avanço democrático. Avalia que é possível preservar as instituições democráticas e avançar na superação de suas principais contradições, apesar dos riscos de retrocesso.

“Apesar da diminuição da extrema pobreza, o país não conseguiu resolver o problema da desigualdade social e racial dentro de parâmetros aceitáveis. Não há como não reconhecer que isso afeta a convicção de que a democracia pode mudar a vida para melhor”, observa o autor. Ele examina o processo de transição da democracia a partir das eleições de 1974 até a eleição de Tancredo Neves; a partir daí, o que ocorreu durante os governos de José Sarney, Collor de Mello, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro, além da encruzilhada em que o país se encontra após dois anos do terceiro mandato de Lula.

De formação gramsciana, o autor analisa o processo de modernização do Brasil na chave da “revolução passiva” e do “americanismo”, que se mantiveram após a redemocratização, numa perspectiva de maior protagonismo da sociedade, porém ameaçado pelo transformismo dos partidos políticos. Essa modernização ocorreu de forma avassaladora, principalmente durante o regime militar, e alterou a morfologia da sociedade brasileira, porém resultou em 40 anos de democracia exitosa, apesar dos grandes deficits políticos e sociais.

Riscos de retrocesso

Segundo Aggio, a democracia brasileira se consolidou institucionalmente, tanto que conseguiu suportar os traumas da realização de dois processos de impeachment, porém correu sério risco, a partir de 2018, com a chegada da extrema-direita ao poder. Entretanto, os órgãos de controle institucionais conseguiram barrar as iniciativas de erosão democrática colocadas em marcha durante o governo de Jair Bolsonaro, impedindo que sua “guerra de movimento” contra as instituições políticas prosperasse.

Para Aggio, a fortaleza institucional da democracia contrasta com a fragilidade da forma como a sociedade vivencia e participa da política. Os partidos políticos, organismos centrais da vida democrática, são incapazes de se abrirem para a dinâmica de transformações que ocorrem na vida social e econômica, porque “se oligarquizaram e se enrijeceram”.

As estruturas voltadas para o enriquecimento de suas lideranças provocaram sentimentos de rejeição da sociedade aos partidos e a perda de confiança na política como instrumento de resolução dos problemas. Mas, por outro lado, avanços institucionais importantes, entre os quais o processo eleitoral, transformaram o Brasil numa democracia de massas.

Apesar disso, Aggio aponta que “o sistema político presidencialista, com seu hibridismo característico, no qual o Executivo é eleito majoritariamente e o Parlamento, proporcionalmente, não tem permitido e tampouco impulsionado reformas políticas significativas no campo da representação, o que afeta a qualidade da democracia.”

Para o historiador, o êxito da construção democrática e o mal-estar diante da dificuldade de legitimação das instituições políticas parecem compor, paradoxalmente, duas faces de uma mesma moeda. “Em razão disso, acaba predominando a desconfiança em relação às instituições políticas que dão sustentáculo à democracia. Mesmo assim, apesar das imperfeições e ineficiências, essas instituições políticas têm sido um fator real de sobrevivência da democracia no Brasil”, avalia.

*Luiz Carlos Azedo, Jornalista, colunista do Correio Braziliense

Leia também: Especial 40 anos da democracia

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Parte 2: Tancredo passa mal. E quem assume?

Parte 3: saída está na Constituição, mas não há convicção]

Parte 4: a manobra para evitar que Sarney assuma

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