A Polícia Federal e o Ministério Público Federal estão investigando o senador Romário (PL-RJ) por envolvimento em suposto esquema de desvio de dinheiro de projetos de esportes da Prefeitura do Rio de Janeiro. O caso também envolve o vereador Marcos Braz (PL-RJ), vice-presidente de futebol do Flamengo. As acusações contra eles partiram de uma delação premiada.
Um inquérito foi aberto no início deste mês no STF (Supremo Tribunal Federal) para investigar o caso, que tem indícios de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Sob sigilo, o inquérito tem relatoria do ministro Kassio Nunes Marques.
A base para as investigações é um anexo da delação premiada do empresário Marcus Vinícius Azevedo da Silva. Ele chegou a ser preso em 2019, acusado de participar do desvio de recursos de projetos sociais do governo e da Prefeitura do RJ.
No ano seguinte, assinou com a PGR (Procuradoria-Geral da República) um acordo de delação premiada, cujos termos e conteúdo estão em sigilo. Logo em seguida, Marcus Vinícius passou a responder ao processo em liberdade.
Segundo Marcus Vinícius, o vereador era o responsável pelo recolhimento de valores desviados no esquema que envolveu uma ONG para “favorecimento ilícito de Romário”. A reportagem não teve acesso a detalhes sobre como se dava o repasse.
O delator afirmou que os pagamentos ocorreram durante a passagem de Braz pelo comando da Secretaria Municipal de Esportes do Rio, cargo para o qual foi indicado por Romário e onde permaneceu entre janeiro de 2015 e março de 2016.
O MPF pediu informações à Prefeitura do Rio sobre contratos assinados por Braz com o Cebrac (Centro Brasileiro de Ações Sociais para Cidadania), no valor total de R$ 13 milhões, para a gestão de vilas olímpicas (espaços para prática de esportes).
Segundo o delator, o dinheiro desviado veio da ONG, que recebeu recursos por meio de contratos com a secretaria de Esportes. Os desvios se dariam a partir do pagamento de valores superiores aos serviços efetivamente prestados, configurando um “superdimensionamento” de serviços.
À reportagem, Romário disse, por meio de nota de sua assessoria de imprensa, que a delação “possui narrativa vaga e imprecisa”.
“O senador Romário não responde pelas ações do secretário [Braz] no exercício de suas funções. Ele reafirma sua confiança na Justiça e no inquestionável arquivamento da investigação”, diz a nota.
A reportagem não teve acesso a provas apresentadas por Marcus Vinícius –que estão sob sigilo e em apuração da PF e do MPF. Para sustentar as informações, o delator deu acesso aos investigadores a anotações, computador e celular.
Se constatado que mentiu, Marcus Vinícius está sujeito à rescisão do acordo e a pena de até quatro anos de prisão. Procurada, a defesa do delator não quis se pronunciar.
Informado pela reportagem sobre a investigação, Marcos Braz se mostrou surpreso e disse que não iria se manifestar.
Contratos de R$ 13 milhões
A reportagem apurou que dois contratos, no total de R$ 13 milhões, foram assinados com a ONG Cebrac durante a gestão de Marcos Braz na Secretaria Municipal de Esporte do Rio, seu primeiro cargo público.
Segundo o delator Marcus Vinícius, houve direcionamento no processo que selecionou a entidade.
O primeiro contrato, de R$ 4,5 milhões, foi assinado em julho de 2015 para a gestão da Vila Olímpica do Greip (Grêmio Recreativo e Esportivo dos Industriários da Penha), na zona norte carioca. O segundo, de R$ 8,5 milhões, assinado em novembro de 2015, foi para a administração da Vila Olímpica Nilton Santos, no bairro da Ilha do Governador (zona norte).
No caso da Vila Olímpica do Greip, foi aberto em agosto de 2015 um processo no TCM (Tribunal de Contas do Município) para a análise do contrato. O principal questionamento dos técnicos do TCM foi em relação ao aumento do valor pago pelo serviço de gestão do espaço em relação aos anos anteriores.
Em 2014, por exemplo, o valor mensal foi de R$ 127,5 mil. Em 2015, com o contrato de dois anos assinado por Braz, o valor passou para R$ 188,6 mil —acréscimo de quase 50%.
Ao longo dos últimos nove anos, o TCM pediu para que a secretaria de Esportes justificasse essa diferença, mas os técnicos do tribunal não consideraram o retorno convincente.
Apesar de não obter os esclarecimentos, o TCM arquivou o processo em abril “por força de sua baixa materialidade e em respeito aos princípios da eficiência, da economia processual e da racionalidade administrativa”.
Para a Vila Olímpica Nilton Santos, foi aberto um processo de análise no TCM em 2018, mas até agora não houve nenhuma decisão. Os documentos não estão públicos.
Relação com ONG
A ONG Cebrac, citada por Marcus Vinícius no anexo da delação que envolve Romário e Marcos Braz, tinha relação com o empresário.
Apesar de estar no nome do assistente social André Elias dos Santos, o Cebrac foi mencionado por Marcus Vinícius em mensagens de 2016 captadas em seu celular pelo MP do RJ. Na ocasião, o delator afirmou que o Cebrac era “nosso”.
A frase foi dita em conversa com o empresário Flávio Chadud, que também foi preso em 2019 na Operação Catarata. Ele é dono da Servlog Rio –atual Star Five Serviços Especializado–, empresa suspeita de desvios de recursos de projetos sociais.
A reportagem ainda localizou pagamentos de mais de R$ 40 mil mensais do Cebrac para a empresa Alfa Mix Serviços e Comércio por serviços de vigilância, limpeza e manutenção para a Vila Olímpica do Greip. Já extinta, a firma pertencia ao delator Marcus Vinícius.
A reportagem não teve acesso a possíveis provas que corroborem as declarações do delator. A apresentação de indícios materiais é obrigatória para fundamentar uma delação.
A ONG e André Elias dos Santos foram procurados por email, mas não se pronunciaram.
Com informações do UOL.