Cidade da Inovação

Acervo pessoal – Residências Innopolis City

Chama-se Innopolis e localiza-se a 40 km de Kazan, a capital da República do Tartaristão, na Rússia. Foi inaugurada em 2012 e, atualmente, cerca de 5 mil pessoas vivem nela, enquanto quase 40 mil trabalham nas oportunidades criadas pelas empresas de tecnologia e startups já instaladas ao redor de uma Universidade de Inovação que atrai talentos de mais de 100 países.

Cada vez mais jovens qualificados chegam à cidade, onde o salário médio supera os dois mil dólares e a qualidade de vida, além de atraente, é marcada por inovações tecnológicas capazes de tornar o cotidiano menos trabalhoso e mais agradável. Com os custos de moradia subsidiados pelo governo russo, morar em Innopolis parece ser bom, bonito e barato.

Nem o inverno rigoroso impede que a vida transcorra com certa normalidade nesse lugar inventado. O fato de poder se deslocar de casa para o trabalho, levar os filhos à escola caminhando ou de bicicleta — mesmo quando a cidade atingir 50 mil habitantes, conforme o projeto original — é um diferencial admirável. Além disso, robôs de entrega são responsáveis pela logística da última milha dos produtos que abastecem as necessidades e desejos dos moradores e trabalhadores de Innopolis. Lá, ninguém mais precisa carregar sacolas nem embrulhos.

As novidades, ou melhor, as inovações disponíveis aos cidadãos dessa “tecnópolis” tártara não param por aí. Robôs substituem garçons nos restaurantes, com eficiência e um senso de humor semelhante ao das secretárias eletrônicas. Táxis circulam sem motorista, tornando aplicativos como o Uber desnecessários. Caixas de supermercado, recepcionistas e até faxineiras, entre outras profissões, estão fora da lista de oferta de empregos. Em Innopolis, até os alojamentos estudantis são limpos por robôs.

Robô garçon – Acervo pessoal

Percorrer os ambientes públicos e semipúblicos dessa “cidade” dedicada à inovação provoca alternadamente admiração e perplexidade. Não parece natural visitar uma imensa casa de leitura onde não há um único livro físico para consulta. Lá, os livros — assim como os pensamentos — estão armazenados na nuvem, dispensando qualquer objeto palpável para a conexão entre eles. A impressão que fica é que algo ali está fora do lugar — talvez a própria biblioteca.

Imagem do interior da biblioteca em Innopolis City – Acervo pessoal

Saí de Innopolis com a sensação de que ela não foi programada para lidar com o inesperado, muito menos com o improviso. Mesmo correndo o risco de ser taxado como um “urbanóide” rabugento, não resisto a afirmar: para se tornar uma cidade de fato, Innopolis terá que se abrir ao erro e ao contraditório, pois cidades não se fazem de bolhas — por mais bem-intencionadas que elas sejam.

*Vicente Loureiro, arquiteto e urbanista, doutorando pela Universidade de Lisboa, é autor dos livros Prosa Urbana e Tempo de Cidade

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