Abin Paralela complica ainda mais o futuro de Bolsonaro

Abin Paralela complica ainda mais o futuro de Bolsonaro

*Luiz Carlos Azedo

A PF compartilhou provas e reservou um capítulo do relatório para as conexões entre a Abin Paralela e a tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023

O futuro político do ex-presidente Jair Bolsonaro está se complicando cada vez mais. Inelegível por causa do crime eleitoral que cometeu ao reunir embaixadores estrangeiros para pôr sob suspeita as urnas eletrônicas do sistema eleitoral brasileiro, já corre o risco de ser condenado como o principal responsável pela tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro, julgamento que está em pleno curso na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). Para agravar a situação, sua participação foi apontada pela Polícia Federal (PF) no caso da Abin Paralela, um plano de espionagem ilegal montado na Agência Brasileira de Inteligência (Abin) em seu governo.

Foram indiciados no esquema o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor geral do órgão, que também é réu no julgamento da tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro, e o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro, filho de Bolsonaro e principal responsável pela bem-sucedida estratégia de comunicação do ex-presidente nas redes sociais. O inquérito indiciou 35 pessoas que estariam envolvidas no grupo de espionagem em favor do ex-presidente e de seus parentes, cuja missão era encontrar situações para desabonar críticos do governo e criar informações falsas contra personalidades e políticos que se opunham ao governo.

A PF compartilhou provas e reservou um capítulo do relatório para as conexões entre a Abin Paralela e o 8 de Janeiro. Foram recuperados arquivos deletados no computador do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, com detalhes sobre o plano Punhal Verde e Amarelo. Segundo os investigadores, a ideia era reverter o resultado das eleições de 2022, assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, do STF.

Ramagem é acusado de orientar o ex-presidente a atacar a credibilidade das urnas e adotar uma estratégia mais hostil no enfrentamento contra “o sistema”, no caso o STF. Segundo a PF, a investigação apurou a atuação de policiais, servidores e funcionários da Abin que teriam formado uma organização criminosa para monitorar cidadãos e autoridades públicas, invadindo celulares e computadores sem autorização judicial. A ferramenta FirstMile foi usada para acompanhar os passos de pessoas que eram consideradas desafetos de Bolsonaro. Esse equipamento permite invadir o sistema de telefonia do Brasil para identificar a localização dos celulares de alvos previamente selecionados.

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Desenvolvido pela empresa israelense Cognyte, o software rastreia a localização de aparelhos em tempo real por meio da exploração de vulnerabilidades em redes de telecomunicações. É usado por Israel para localizar alvos e eliminar adversários. No Brasil, foi adquirido pela Abin por R$ 5,7 milhões, em contrato firmado sem licitação. Segundo a PF, até maio de 2021, serviu para monitorar milhares de linhas, sem autorização judicial. O sistema não é acessível ao público. O uso do FirstMile é restrito às agências estatais e requer aprovação específica, inclusive do governo de Israel. A comercialização é controlada e direcionada a órgãos de segurança e inteligência.

Espionou geral

Foram alvos dessas operações os ministros do STF Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux; o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL); o deputado Kim Kataguiri (União-SP); os ex-deputados Rodrigo Maia, também ex-presidente da Câmara, Joice Hasselmann e Jean Wyllys; e os senadores Alessandro Vieira (MDB-SE), Omar Aziz (PSD-AM), Renan Calheiros (MDB-AL) e Randolfe Rodrigues (PT-AP), que integravam a CPI da Covid.

A investigação da PF veio a público em 2024, com a Operação Última Milha, batizada em referência à ferramenta, que realizou uma série de mandados de busca e apreensão. Pessoas ligadas a investigações envolvendo parentes de Bolsonaro também foram monitoradas, como os auditores da Receita Federal que fizeram o relatório que deu origem à investigação do esquema de “rachadinha” no gabinete do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), quando era deputado na Assembleia Legislativa fluminense. Marcelo Bormevet e Giancarlo Rodrigues, que estavam a serviço da Abin em ações clandestinas, tentaram “achar podres” dos auditores.

Outro caso relatado pela PF foi o monitoramento de Allan Lucena, ex-sócio de Jair Renan, e de Luís Felipe Belmonte, empresário, com objetivo de favorecer o filho 04 do ex-presidente, que era investigado por tráfico de influência, em 2021. Bormevet, que atuava na Presidência da República, e Giancarlo, na Abin, produziram dossiês falsos e disseminaram fake news para atacar a credibilidade das autoridades.

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Cada vez mais enrolado no STF, Bolsonaro está sendo aconselhado por seus aliados a anunciar apoio à candidatura do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, a presidente da República. O compromisso entre ambos seria de que, caso seja eleito, conceda indulto ao ex-presidente ou apoie uma anistia geral aos envolvidos na tentativa de golpe de Estado, a ser aprovada pelo futuro Congresso. Bolsonaro refuga porque não confia em ninguém e teme que Tarcísio, se eleito, dispute a reeleição em 2030, o que seria o fim de suas pretensões de voltar à Presidência. Por ora, prefere indicar um dos filhos, Eduardo ou Flávio, ou a mulher, Michele.

*Luiz Carlos Azedo, Jornalista, colunista do Correio Braziliense.

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