O Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão, localizado na Ilha do Governador, na Zona Norte, ultrapassou, em maio deste ano, a marca de 1 milhão de passageiros pela quinta vez depois do início das restrições impostas ao Aeroporto Santos Dumont, no Centro, no segundo semestre do ano passado. Com as mudanças, o Galeão passou de 10º para o 4º aeroporto mais movimentado do país. Neste ano, a somatória dos cinco primeiros meses já corresponde a 70% do valor total de 2023.
Dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), consultados pelo DIA, mostram que o Tom Jobim registrou 1.011.600 passageiros, entre embarque e desembarque de voos domésticos e internacionais, em maio. O fato fez com que o Galeão ocupasse a 4º colocação no ranking de aeroportos do país, pelo terceiro mês consecutivo, ficando atrás apenas de Guarulhos e Congonhas, em São Paulo, e de Brasília, no Distrito Federal.
Não é a primeira vez que o aeroporto ultrapassa a marca de 1 milhão de pessoas em um mês desde que os voos domésticos foram concentrados no local. Em dezembro de 2023, houve registro de 1.027.266 pessoas; em janeiro de 2024, passaram 1,3 milhão de passageiros, o tornando o 2º aeroporto mais movimentado do Brasil; em fevereiro de 2024 foram 1.089.820; e em março deste ano foram 1.075.252.
Considerando a soma de passageiros nos cinco primeiros meses deste ano, o Galeão teve 5,4 milhões de pessoas, o que já equivale a 70% do valor total de 2023 (7,7 milhões). Neste mês de julho, a estimativa é de 1,2 milhão de passageiros, representando o dobro do resultado do mesmo mês de 2023, um aumento de 100%.
A previsão da concessionária RIOGaleão é que o espaço chegue a marca de 14 milhões de passageiros em 2024. A empresa destacou que o avanço no ranking da Anac reflete os efeitos da coordenação dos aeroportos da cidade, que possibilitou o aumento de voo no Galeão e a quantidade de pessoas e cargas, o que “é muito positivo para a economia do Rio de Janeiro”.
“A coordenação dos aeroportos resulta no uso adequado da infraestrutura disponível nos dois aeroportos do Rio de Janeiro, proporcionando mais conectividade ao estado, que reflete diretamente no crescimento da oferta de voos e da movimentação de passageiros e de cargas. Esse cenário tem sido muito positivo para a economia do Rio já nos primeiros meses da mudança. Nesse ano, esperamos receber 14,2 milhões de viajantes. Desse total, 4,6 milhões devem ser internacionais, um crescimento de 30% frente ao ano passado e recorde histórico para a cidade, que movimenta toda a cadeia do turismo, gerando emprego e renda para o carioca”, disse Alexandre Monteiro, presidente do RIOgaleão.
Elogios para as mudanças
A reportagem conversou, nesta quarta-feira (17), com passageiros do Galeão, que elogiaram as mudanças ocorridas no aeroporto. O militar Ivan Araújo, de 33 anos, levou a irmã para uma viagem e contou que a ampliação dos voos no local melhora a economia.
“Achei ótimo esse movimento maior por mais que o aeroporto esteja mais cheio. Tanto que não foi fácil achar vaga no estacionamento. Achei bom para a economia. Não podemos pensar somente em nós”, destacou.
O casal Nathalie Meschesi, de 45, e Leonardo Borges, de 50, frequentadores assíduos do Galeão, citaram a oportunidade de emprego e o fácil deslocamento. “Achei esse aumento ótimo porque gera mais empregos. Por outro lado, aliviou o Santos Dumont que estava cheio demais”, disse a empresária. “Foi bem fácil chegar ao aeroporto. Principalmente por conta da sinalização na Linha Vermelha”, completou o autônomo.
Quem trabalha no espaço também nutriu elementos positivos das mudanças. Uma loja de souvenir teve um aumento de 15% a 20% nas vendas no primeiro trimestre deste ano.
Geraldo Rodrigues, 57, taxista no Galeão há 25 anos, disse que consegue oito a nove passageiros por dia, gerando um lucro de R$ 300 a mais do que no ano passado. “Antes, eu conseguia dois ou três passageiros por dia. Hoje, melhorou muito. Para a gente que é taxista está tranquilo chegar aqui por causa da seletiva”, explicou.
Gabriel Ribeiro, de 26 anos, que trabalha com orientação aos passageiros, destacou que conseguiu o emprego devido a ampliação do movimento no aeroporto. “Minha expectativa é poder crescer dentro da empresa. São muitas orientações. A gente se reveza entre as áreas de embarque e desembarque, então chego a atender uns 400 passageiros por dia”, contou.
O secretário municipal de Desenvolvimento Urbano e Econômico do Rio, Chicão Bulhões, explicou que os estudos para reequilibrar o funcionamento dos aeroportos levaram em conta o impacto para a economia da cidade e do Estado. Pelos cálculos, a mudança aumentará em R$ 50,6 bilhões a movimentação da economia fluminense, em 10 anos, gerando 685 mil empregos no mesmo período.
“As mudanças nem completaram um ano e todos esses impactos já foram percebidos – na economia, no turismo e na melhora do serviço –, quase de forma imediata. Certamente estamos no caminho certo e poderemos ver, em breve, mais ganhos de movimento na economia e na geração de empregos. Só há pontos positivos. Com a coordenação entre os aeroportos já podemos perceber: um aumento do número de turistas, mais companhias operando no Galeão, mais rotas disponíveis, voos diretos para cidades na Europa e Estados Unidos e queda nos preços das passagens, por exemplo. Todos nós, poder público e cariocas, queremos que o Rio tenha uma economia pujante. Isso é o que gera emprego, renda e melhora a vida das pessoas”, comentou.
Bulhões acrescentou que as mudanças na recuperação do Galeão eram necessárias, pois uma cidade como o Rio, sede de empresas multinacionais e principal destino turístico do país, não poderia ficar sem um aeroporto internacional. A ideia é continuar trazendo grandes eventos culturais e de negócios para a cidade e explorar mais viagens.
Para Wagner Victer, ex-secretário de Estado de Energia, da Indústria Naval e do Petróleo, que começou o movimento de revitalização do Galeão na Assembleia Legislativa do Estado do Rio (Alerj) há cinco anos, as mudanças trouxeram benefícios inclusive para o setor de cargas.
“O movimento permitiu inclusive o maior aumento da carga movimentada no terminal de cargas do Galeão. Isso é um aspecto extremamente importante porque 60% das cargas que chegam por avião. Como chegava no Santos Dumont lá não tem terminal de carga. O Rio de Janeiro perdia na captação de carga. Tivemos um aumento brutal no captor de carga do Rio e isso representa um aumento tributário relevante e muito emprego na geração de carga e na competitividade da indústria, ou seja, a indústria do Rio de Janeiro ganhou muito com a revitalização do Galeão”, comentou.
Victer entende que esse crescimento de carga irá continuar nos próximos anos, especialmente em voos internacionais.
“Na medida que você traz voos nacionais para o Galeão você aumenta a conectividade. Aumentando você cresce a atração de ponto a ponto internacional. Hoje é muito mais barato desembaraçar e movimentar carga mais rápido no Galeão do que em Guarulhos. Muitas empresas que faziam isso em São Paulo estão movimentando pelo Galeão. Talvez o Galeão tenha sido o maior exemplo de movimento de união do Rio de Janeiro dos últimos cinco anos”, destacou.
Valorização do turismo
Vitor de Pieri, professor do Instituto de Geografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), destacou que o Galeão está recuperando o movimento que precisa para se sustentar depois de perder muitos passageiros com a pandemia de covid-19. Na época, as empresas aéreas nacionais preferiam pousar e decolar no Santos Dumont devido a sua localidade e facilidade de deslocamento.
“O Galeão começou a sofrer muito com a falta de passageiros. O aeroporto vive pelo fluxo de passageiros. A administração do aeroporto trabalha com a venda de serviços e com a locação de espaços. A queda abrupta na circulação de passageiros prejudicou muito o Galeão. Isso fez com que a empresa que tem a concessão entrasse em uma crise grande e ameaçasse até mesmo abrir mão da concessão”, comentou.
Para de Pieri, a intervenção dos Governos Federal, Estadual e Municipal, com a limitação de voos no Santos Dumont, modificou o cenário do Galeão. O professor destacou que a mudança valorizou a economia da cidade, principalmente por se tratar de um aeroporto internacional, o que aumenta o número de chegada de turistas de outros países no Rio.
“O Rio de Janeiro não vive sem o Galeão. Ele é a principal porta de entrada de turistas internacionais. O Rio é uma das principais, se não a principal, cidade turística do Brasil, e precisava desse aeroporto funcionando a todo vapor. O Santos Dumont sempre vai ter fluxo de passageiros, mas ele tem uma capacidade de movimentação muito menor do que o Galeão. Como os aeroportos vivem da venda de espaço para serviços e o preço de aeronaves é o que gera receita para as administradoras dos aeroportos, esse fato fez com que o aeroporto do Galeão sobreviva e consiga se sustentar. Isso é muito positivo para a economia carioca. Isso vai garantir o pleno funcionamento do aeroporto do Galeão, o que contribui muito especialmente no turismo internacional e com uma série de atividades econômicas que giram em torno do turismo na cidade e do próprio aeroporto”, destacou.
Vitor ainda ressaltou que a questão de localidade e deslocamento, o que seria um empecilho maior para o Galeão, vem sofrendo mudanças como a faixa exclusiva na Linha Vermelha para acesso à Ilha e ao aeroporto, uma linha de ônibus direta do Terminal Gentileza, no Centro, até o local e a previsão de uma linha de barcas que liga o Galeão e o Santos Dumont.
O professor Aurélio Murta, doutor em Engenharia de Transportes e titular do Departamento de Administração da Universidade Federal Fluminense (UFF), explicou que o crescimento do Galeão está ligado a fatores como: recuperação econômica da sociedade brasileira, flexibilização das restrições de viagens, ampliação das ofertas de voos, promoções e tarifas atrativas, realização de grandes eventos e investimentos em infraestrutura.
“O retorno das atividades econômicas, após a pandemia, facilitou tanto viagens de lazer quanto de negócios, criando um ambiente propício para o crescimento do movimento de passageiros no Galeão. A redução das medidas restritivas, como a exigência de testes e quarentena, foi um fator crucial para a retomada das viagens internacionais. Essa flexibilização facilitou a locomoção entre países, estimulando o turismo e impulsionando o fluxo de passageiros. A combinação desses elementos resultou em um aumento expressivo do movimento de passageiros no Galeão, consolidando-o como um dos principais aeroportos da América Latina”, comentou.
Em contrapartida, Murta entende que o que contribuiu para a queda de passageiros no Santos Dumont foi a limitação de voos com a concentração de viagens no Galeão, além da capacidade física do aeroporto.
“O Santos Dumont, com suas limitações físicas e restrições regulatórias, viu uma diminuição em seu movimento, reforçando seu foco em voos domésticos de curta distância. Essa análise indica que o Galeão continuará a se expandir e fortalecer sua posição nos próximos anos, enquanto o Santos Dumont se ajusta à nova realidade do transporte aéreo no Rio de Janeiro. É essencial acompanhar as tendências e os desenvolvimentos no setor aeroportuário para entender plenamente os impactos dessas mudanças”, disse.
Restrições ao Santos Dumont
O aumento da movimentação no Galeão está atrelada indiretamente às restrições impostas ao Aeroporto Santos Dumont, no Centro do Rio, no ano passado. Em junho de 2023, o prefeito Eduardo Paes (PSD) divulgou que os voos no local seriam realizados apenas para dois destinos: Congonhas e Brasília. O anúncio aconteceu após uma reunião com o presidente Lula (PT).
O objetivo da ação era concentrar os voos nacionais no Galeão, pois o aeroporto vinha perdendo um grande número de passageiros desde a pandemia, enquanto o Santos Dumont operava no limite de sua capacidade, com registro de grandes e demoradas filas. O fato preocupava Paes já que o Galeão é a porta de entrada para a chegada de turistas internacionais.
A resolução que limitou os voos no Santos Dumont foi assinada em 10 de agosto. A norma determinava que o terminal recebesse, além da ponte aérea, viagens para localidade até 400 quilômetros. Em novembro de 2023, o modelo foi revisto. Em vez da distância geográfica, o Governo Federal definiu que a restrição se daria com base no limite de passageiros, sendo o máximo de 6,5 milhões por ano, abrindo espaço para rotas que ligam o Rio a Brasília, Belo Horizonte e algumas capitais do Nordeste. Contudo, manteve-se o veto a voos com destino a aeroportos internacionais, como Guarulhos.
A medida de limite de pessoas começou a valer em janeiro deste ano. A última vez que o Santos Dumont registrou mais de 1 milhão de pessoas foi em setembro de 2023. Em novembro do ano passado, o espaço foi ultrapassado pelo Galeão. De acordo com o último levantamento da Anac, em maio deste ano, o Santos Dumont ocupa a 8º colocação no ranking de aeroportos com 531.544 passageiros.