O União Brasil acionou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para tentar cassar o deputado federal Chiquinho Brazão (RJ), mas o pedido não tem nada a ver com a acusação da Polícia federal de que o deputado seria um dos mandantes da morte da vereadora carioca Marielle Franco (PSOL).
Segundo informa a colunista Malu Gaspar, do jornal O GLOBO, o antigo partido de Brazão – que o expulsou em março passado, depois do relatório da PF que o acusa do crime – quer que ele perca o mandato por infidelidade partidária.
No pedido, o partido alega que, a continuidade de Chiquinho no cargo de deputado “poderia prejudicar a confiança pública no sistema político, que depende de figuras públicas que não apenas professam, mas também praticam os princípios éticos e democráticos”.
Na prática, porém, o pedido visa recuperar a vaga de deputado para o partido. Isso porque, se Chiquinho perder o mandato, quem assume é primeiro suplente, que é do União Brasil: Ricardo Abrão, sobrinho do bicheiro Aniz Abraão David e ex-secretário especial de ação comunitária da prefeitura do Rio.
No último dia 18, a Primeira Turma do STF aceitou por unanimidade a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Chiquinho e seu irmão, o conselheiro Domingos Brazão, do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro (TCE-RJ), por homicídio qualificado de Marielle e de seu motorista Anderson Gomes, além da tentativa de homicídio da assessora Fernanda Chaves, que sobreviveu ao atentado.
Os irmãos Brazão também se tornaram réus por organização criminosa.
Em março, a comissão executiva nacional do União Brasil expulsou Chiquinho do partido por unanimidade, em uma reunião extraordinária convocada às pressas em plena noite de domingo após o relatório da PF vir à tona. Um mês depois, a sigla acionou o TSE para cassar o mandato do parlamentar.
Na ação apresentada ao TSE, o União Brasil admite que a atual jurisprudência favorece a sobrevivência política de Chiquinho, já que o tribunal considera que a expulsão de um parlamentar de um partido não se enquadra na hipótese de infidelidade partidária capaz de atrair a perda do mandato.
“No entanto, em face da natureza das acusações e da severidade das infrações cometidas por João Francisco Inácio Brazão, esta representação busca a revisão dessa interpretação, fundamentando-se na filtragem constitucional e em posição que defende a necessidade de se interpretar a legislação eleitoral aos princípios da moralidade e da fidelidade partidária”, insiste o partido.
O relator do caso é o conservador Kassio Nunes Marques, ministro escolhido por Bolsonaro para o STF e considerado mais garantista, ou seja, menos inclinado a punir parlamentares – e muito menos a cassá-los.
Ainda não há previsão de quando o tema vai ser enfrentado pelo plenário do TSE, que conta atualmente com uma maioria conservadora – formada por Nunes Marques, André Mendonça, Raul Araújo e Isabel Gallotti.
Em parecer enviado ao TSE no mês passado, o Ministério Público Eleitoral se posicionou contra o pedido do União Brasil para que Chiquinho seja cassado pelo tribunal.
Na opinião do vice-procurador-geral eleitoral, Alexandre Espinosa, uma eventual decisão nesse sentido cabe à Câmara dos Deputados – onde um pedido de cassação de Chiquinho tramita lentamente no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar.
“Esta, portanto, é a instituição de poder competente para decidir o destino do mandato do parlamentar, uma vez que a questão, na seara dos direitos políticos, versa conduta incompatível com o decoro parlamentar, nos termos da Constituição”, observou Espinosa.
“A expulsão do filiado alicerça-se em causa apurada na seara penal, por suspeita do cometimento de crime de homicídio. Os motivos que levaram à prisão preventiva do representado e, por consequência, a instauração do procedimento para expulsão do filiado com base no Estatuto Partidário dizem respeito a causa não afeta à competência da Justiça Eleitoral.”
O processo de Chiquinho no Conselho de Ética da Câmara já sofreu uma série de atrasos e segue em marcha lenta.
Eleita vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL em 2016, com 46 mil votos (a quinta candidata mais bem votada do município), Marielle Franco teve o mandato interrompido por 13 tiros na noite de 14 de março de 2018, num atentado que vitimou também seu motorista Anderson Gomes.
O caso é relatado pela deputada novata Jack Rocha (PT-ES), escolhida após uma série de desistências em sorteios anteriores conduzidos pela presidência do colegiado, comandado por Leur Lomanto Júnior (União-BA), e em última instância pode levar à cassação de Chiquinho.
Procurada pela equipe da coluna, a defesa de Chiquinho não se manifestou até a publicação desta reportagem.